2 Espacialidades suburbanas - Vol. 1 Nº2/ outubro 2023
Editorial: Espacialidades Suburbanas
Com este segundo número de nossa revista, caminhamos para oferecer uma circulação regular aos “Novos Diálogos Suburbanos”. Trazer à discussão os olhares dos subúrbios e seu apagamento, motivaram a proposta de criação de nossa revista dedicada a expor as questões da sociabilidade, espacialidade, educação e patrimônio dos subúrbios e as periferias do Rio de Janeiro. Esses são os eixos temáticos dos quatro primeiros números da revista, que esperamos se multipliquem por muitos mais em futuro próximo.
A questão das “espacialidades suburbanas” refere-se, stricto sensu, às formas de organização e características do espaço social e suas relações. Abarca igualmente as formas de usos e apropriações desse espaço que se modificam historicamente, incluindo as formas arquitetônicas, suas atividades e funções, objetos e estruturas, modos de apreensão e sentidos.
Desta maneira, entende-se que a espacialidade urbana, e/ou suburbana, seja, não somente, aquela que trata das questões do espaço físico e seu ambiente, como também dos espaços das práticas do social, do econômico, do cultural e dos lazeres, do político e suas organizações e coletivos, com uma visão que nos aproxime das pessoas, suas maneiras de viver, habitar a cidade, bem como as formas de relação entre as pessoas e o universo que configura o seu vivido. Entende-se a espacialidade urbana numa perspectiva relacional cujos nexos entre os seus diferentes elementos e pessoas – grupos sociais, atores e sujeitos – remetem a uma tipologia arquitetônica e sua relação com a morfologia da cidade, sua história e seus lugares geográficos, na qual os subúrbios assumem papel ímpar, como espaços múltiplos, dinâmicos e diversos.
Os artigos que compõem este número da revista dialogam com produções acadêmicas que permeiam a temática da espacialidade suburbana, como o texto de Márcio Piñon acerca da obra de seu amigo, o geógrafo Nelson da Nóbrega Fernandes, autor de “O rapto ideológico da categoria de subúrbio”, dentre outras obras significativas como a coletânea de textos “150 anos de subúrbio carioca” organizada por ele e pelo próprio Piñon. Outro artigo que debate produções sobre a espacialidade é a resenha de Selene Herculano, sobre o livro “As águas encantadas da Baía de Guanabara” da autoria de Jorge Luiz Barbosa, Diogo Cunha e Ana Thereza de Andrade Barbosa que resgata imagens e histórias das muitas praias suburbanas que desapareceram por aterramento ou pela própria poluição.
Em artigos de opinião contamos com a presença de Victor Melo, “O subúrbio e seus clubes”, que traz as agremiações esportivas suburbanas e suas relações com as atividades sociais, políticas e econômicas, principalmente na primeira metade do século XX. Segue-se a este o artigo “Entre a Invisibilidade Imposta e o Reexistir Afetivo: Resistência Simbólica Suburbana no Bairro do Andaraí/RJ” de autoria de Luiz Espírito Santo, esquadrinhando a categoria de centralidades regionais de determinados bairros que acabam ofuscando a existência de outros bairros fronteiriços a estas espacialidades.
Rachel Gomes de Lima apresenta a trajetória do coletivo Engenhos de Histórias, atuante na espacialidade do grande Méier. No artigo intitulado “Mais que engenhos, histórias” o referido coletivo é analisado desde seu surgimento, passando por objetivos e atividades realizadas, chegando até a produção do livro “Um grande Méier de Histórias” organizado pela mesma autora e por Rafael Mattoso.
Excepcionalmente, contamos com cinco crônicas nesta edição. A primeira, de Adriana Batista, inicia-se com a história de Catanha e o legado do futebol para a região de Guadalupe. Em seguida, temos a crônica de Priscila Carvalho, “E se o subúrbio falasse?”, trazendo memórias da infância e a crítica à história contada apenas pelo centro e zona sul, enquanto viaja pelas estações de trem. E por falar em trem, Adilson Franco e Ana Cabral Rodrigues nos brindam com a crônica “Isto é um dizer subúrbio”, com reflexões a partir das estações férreas e as ruas que permeiam a espacialidade suburbana. Roberto Mattos reúne uma curiosidade à memória do antigo carnaval de Madureira e seus “coretos” comemorativos. Em particular o de homenagem a Santos Dumont no ano de 1924, uma réplica da Torre Eiffel, imortalizada posteriormente em pintura da Tarsila do Amaral, pioneira da arte moderna brasileira.
Por sua vez, a crônica de Juliana Rego nos traz o estranhamento de sua amiga ao descobrir o universo do transporte público por trilhos dos subúrbios e periferias. Esta primeira viagem da amiga aos subúrbios acompanha as memórias poéticas do barulho do rodeiro dos vagões no trilho, do balançar que embala este espaço urbano em deslocamento, para além das relações que os passageiros estabelecem. Tudo na experiência de uma viagem, com surpresas e estranhamentos, ao “distante” bairro de Marechal Hermes.
A crônica de Lígia Castanheira traz à luz a relação espaço/memória no subúrbio, ao nos revelar sua vivência no bairro de Bangu e mostrar a importância do espaço urbano construído para a memória compartilhada das pessoas. Para ela tanto espaço quanto memória são sistemas que nos remetem a experiências próprias e que variam de uma pessoa a outra. O processo de industrialização da cidade com a implantação da fábrica e do bairro por ela construído representa o espaço de memória que funda este lugar. E por fim, a contundente fala poética de Zidane Silva repercute a voz dos “sem-lugar”, os esquecidos, nas estações apagadas de nossas cidades.
Convidamos a todos e todas a incursionarem na espacialidade suburbana e realizarem uma excelente leitura!
Antônio José Pedral, Márcio Piñon e Rachel Lima