4 Patrimônios suburbanos - Vol. 1 Nº 4 / fevereiro 2024
Editorial: Patrimônios Suburbanos
Este número reúne autores, militantes e pesquisadores que têm interesse em compartilhar conhecimentos e reflexões sobre bens que possam ser operados como patrimônio cultural do subúrbio do Rio de Janeiro. Tradicionalmente entende-se patrimônio cultural como um conjunto de bens afetados por ações de consagração do Estado, sejam eles bens isolados, conjuntos urbanos, paisagens, monumentos ou saberes e práticas culturais, reconhecendo um caráter de serem referências de determinado grupo social. Noções como referência cultural, material, imaterial ou intangível são importantes marcadores dessas políticas, definindo determinada gramática e conceitos fundamentais, muitas vezes incompreendidos. Sem que se perca a importância de reconhecer balizas que sustentam o debate, entendemos que esses conceitos podem e devem ser tensionados, sendo esse um dos objetivos deste número em nossa jornada da Revista Novos Diálogos Suburbanos.
Nos interessava textos, ensaios e experiências que nos ajudassem a conhecer e refletir sobre o conjunto de bens que compõem ou possam compor o que compreendemos como Patrimônio Suburbano Carioca. Nesse processo, pretendíamos contribuir para a problematização das referências que geralmente condicionam o entendimento da memória urbana da cidade, muitas vezes reduzidas ao “patrimônio de pedra e cal” das áreas mais enobrecidas da cidade. Temos a aspiração de estimular perspectivas mais inclusivas e decoloniais que consideram o papel de movimentos sociais, coletivos culturais, artistas populares e evidentemente moradores, enquanto responsáveis pela criação e manutenção dos patrimônios do subúrbio. A proposta é também a de trazer uma perspectiva interdisciplinar para pensar a memória e seus suportes no subúrbio carioca. Consideramos a importância de considerar áreas de atuação tão distintas como a arquitetura, os estudos sobre as políticas e planejamento, a sociologia, a geografia, a história, a antropologia, a literatura ou tantas outras que costumam contribuir para pensarmos o patrimônio cultural.
Valorizamos, na seleção das contribuições, abordagens que exploram elementos dos bairros suburbanos, suas paisagens, arquiteturas, expressões artísticas e costumes. As contribuições do número apontam para esse sentido, condizente com a pluralidade do subúrbio, em múltiplas experiências vivenciadas por seus moradores. São textos diversos em formato e perspectiva, somando-se ao ensaio fotográfico de Roberta Domingos que ilustra muito do imaginário do subúrbio. O número abre com Melissa Martins, que destaca uma nova postura de maior escuta, frente às politica públicas para o patrimônio cultural. Em seguida, Jessica Ojana problematiza as noções tradicionais de patrimônio ao propor um novo olhar para o que poderia ou não ser reconhecido como tal. Por exemplo, os cinemas de rua são recorrentes nos debates sobre o patrimônio cultural na cidade do Rio de Janeiro. Especialmente nos subúrbios, onde a escassez de equipamentos de cultura é gritante, os cinemas de rua, ou sua ausência, são de extrema importância para pensar a cidade. Os textos de Laís Lucena, de Andressa Navarro, e de Ana Cabral, Fabio de Jesus e Rodrigo Telles vão nesse sentido, de propor, de diferentes formas, o reconhecimento e a necessidade de mais atenção aos cinemas como suportes de memória. A entrevista com Charles Costa, feita por Allysson Lemos, chama a potencialidade de ações que envolvam o cinema, como uma ação de valorização de determinado espaço. Melissa Martinha destaca uma nova postura de maior escuta, frente ao patrimônio cultural. Lucas Chiconi Balteiro realiza uma reflexão sobre os subúrbios paulistas e nos instiga a buscar comparações com o subúrbio carioca. Antonio Pedral discute a importância de fugirmos de concepções minimalistas sobre o território do subúrbio, compreendendo que ele é parte de uma cidade híbrida e complexa. Edmar Araújo propõe chaves conceituais para pensar as relações entre patrimônio, valor e a produção da cidade. Por fim, Renato Alves e Silva, em crônica, aproxima o patrimônio das vivências de cada dia e destaca as relações de uso do patrimônio com o viver da(s) cidade(s).
Convidamos os leitores a experimentar a cidade através do olhar e da reflexão sobre o patrimônio suburbano, na lente dos autores aqui reunidos. Que nossos esforços ajudem a pensarmos em novos e antigos patrimônios, em uma nova cidade, mais plural, inclusiva e justa.