Revista Novos Dialogos Suburbanos Revista Novos Dialogos Suburbanos

Vol. 1, Nº2/ 2023

2 Espacialidades suburbanas - Vol. 1 Nº2/ outubro 2023

Crônica

Madureira e Tarsila do Amaral, um elo de paixão

Roberto Mattos de Mendonça

Bem-vindos a Madureira! Bairro em formação na segunda década do século XX , apresentava problemas comuns aos outros lugares dos subúrbios da Central do Brasil.
“Apezar do seu movimento intensíssimo , do seu commercio progressivo e da sua numerosa população só parte de uma de suas ruas tem illuminação electrica. Não tem gaz, e calçamento só duas ruas, em partes o possuem.” Jornal A Noite – 1923.

“Porcos, carneiros, galinhas, cachorros, gatos, cabras, etc., andam pelas ruas e praças do logar, e as cobras venenosas quase todos os dias mordem os transeuntes. Á noite não se pode dormir devido á cantoria dos sapos nas lagoas.” Jornal A Noite – 1924.
É nesse cenário que se foi construindo a tradição do Carnaval de Madureira. Primeiramente festejado quase exclusivamente em clubes carnavalescos que apresentavam os seus préstitos aos moradores locais e das adjacências .

Os coretos grandiosos, novidade de Madureira, tiveram início na crise financeira de 1918 provocada pela Primeira Grande Guerra Mundial.
Os comerciantes do Largo de Madureira perceberam então, o grande negócio que o Carnaval podia proporcionar e investiram pesado na confecção dos chamados CORETOS ARTÍSTICOS, denominado s por eles de alegoria fixa. O primeiro deles foi em 1920, com a construção de navio de guerra, um Cruzador, a um custo de uma pequena fortuna de 2.320$000 (dois contos e trezentos e vinte mil réis), que rendeu muito sucesso, pois cerca de vinte mil pessoas estiveram no Largo para apreciá-lo.

Imagine você, caro leitor, hoje, no Largo de Madureira, tamanho aglomerado de pessoas! Que movimento espetacular no comércio não apresentaria?
Então, de olho no sucesso alcançado, os comerciantes locais partiram para aprimorar os coretos nos anos seguintes, até que, em 1924, resolveram homenagear Santos Dumont, construindo uma réplica daTorre Eiffel, de autoria do cenógrafo e comerciante local José da Costa.O coreto media 18 metros de altura, tendo uma base quadrada de 24 metros, contando com três pavimentos giratórios, um farol e um balão Santos Dumont, iluminação elétrica de 400 lâmpadas e instalações para bandas de música e de clarins. O custo da obra, rateado entre os comerciantes, ficou em 12.000$000 (12 contos de réis).


É esta paisagem que Tarsila do Amaral encontrará no Carnaval em Madureira. Como chegou até lá, não sei. Pode ter ido de trem, bonde ou automóvel. Qual caminho tomou para chegar a Madureira? Quando chegou ficou maravilhada com a obra exposta naquele lugar sem atrativo, mas que sabia causar surpresas. Tarsila então fez os croquis para a futura obra denominada CARNAVAL EM MADUREIRA e deve ter ficado impressionada com a construção do grandioso coreto e o movimento de pessoas no lugar. Naquele ano, 1924, há uma constatação de que “vinte e cinco mil pessoas foram visitar aquella locallidade para apreciar a famosa tradição do logar, o belo e custoso coreto levantado no largo de Madureira pelo commercio local”. Jornal A Noite – 1924

Desta forma, Madureira mostra a sua força como local apreciado para se brincar o Carnaval, tendo a sua criatividade mostrada ao mundo através da obra modernista de Tarsila do Amaral.

ROBERTO MATTOS DE MENDONÇA é professor da Rede Pública, com uma pesquisa em andamento “Um Componente Variável – Os Coretos De Madureira 1920-1940.”