1 Cultura e sociabilidades - Vol. 1 Nº 1/ agosto 2023
Ora (direis) caquinhos
O piso de caquinhos está para o subúrbio assim como o padrão de azulejos enxaquetados azuis e brancos está para o botequim carioca. Metonímias. Querem falar de botequins, botam lá o logotipo de azulejos. O papo é subúrbio carioca? Lá estão os caquinhos, estilizados que sejam! A diferença, nada pequena, é que fica cada vez mais difícil encontrar botequins com os, outrora famosos, azulejos azuis e brancos… já os pisos de caquinhos, para o nosso deleite, são ainda moeda corrente no vasto subúrbio carioca.
Passei a colecioná-los. Fotos, claro! Como soem ser colecionadores, de maneira intensa e obsessiva. Em verdade, os pisos de caquinhos são tão comuns que limitei meus registros àqueles que revelam intenções estéticas e organizadoras, assim guardo estrelas, sóis, geometrias… Uma borboleta no Méier! Gatinhos em meio às estrelas e novelos na Tijuca!
Quando os caquinhos se recusam a ficar apenas no chão e invadem muros, bancos, espelhos de escada, corrimãos, rodapés, a isto chamo: “invasão de caquinhos”, e registro também.
Segue pequeno apanhado, nas indefectíveis cores: vermelha, preta e amarela; raramente surgem outras. Uma arte, amiúde, ignorada. Percebo o espanto – para não dizer estupefação – de algumas pessoas quando descobrem que, sim, não fiz uma selfie, não fotografei o artista famoso, nem o Pão de Açúcar, mas aquele piso ali, tão bonito.
Não posso senão me lembrar dos versos de Yeats:
“I have spread my dreams under your feet.
Tread softly because you tread on my dreams”.
Espalhei os meus sonhos sob teus pés
Pisa devagar, pois pisas em meus sonhos.